Escrito por Mariana Nunes
Em um contexto de mudanças climáticas e transição energética, é esperado o crescimento da participação de fontes renováveis como eólica e solar. Contudo, a variabilidade das fontes intermitentes traz novos desafios operativos, como a necessidade de flexibilidade para a operação segura do sistema.
A flexibilidade pode ser requerida em diferentes escalas de tempo e contempla diversos serviços relacionados à segurança e qualidade do suprimento de energia (serviços ancilares). Diferentes tecnologias são capazes de prover o sistema de flexibilidade, contudo, são necessários avanços regulatórios e, eventualmente, a criação de mercados específicos para a viabilização de determinadas infraestruturas, como as usinas hidrelétricas reversíveis (UHR ou PHS, em inglês).
Como funcionam?
A Agência Internacional de Energia (IEA) aponta usinas hidrelétricas (UHE) como principais provedoras de flexibilidade de baixo custo e baixas emissões de gases de efeito estufa, com destaque especial para as reversíveis. As UHR são importantes tecnologias de armazenamento de energia, podendo ser chamadas de verdadeiras baterias de água. Sua função de geradora de energia se torna secundária, pois seu principal papel é conferir serviços aos sistemas elétricos através do estoque flexível de água. São sistemas que contam com dois reservatórios, um superior e outro inferior, conectados e geralmente menores que uma UHE tradicional no Brasil.
As UHRs bombeiam água para cima em momentos de excedente energético, como resposta da demanda, recarregando a “bateria”, ou turbinam água para baixo em momentos de necessidade energética, utilizando a “bateria” e trabalhando em ambos os sentidos, absorvendo energia do sistema ou fornecendo eletricidade, de forma flexível.
As UHRs podem compor um ciclo fechado, ou seja, desconectados de um rio, ou abertos, com o reservatório inferior pertencente a um curso d’água ou o próprio rio. Os momentos de excedentes energéticos são sinalizados por preços mais baixos de energia, motivados pela alta produção de usinas eólicas e solares ou de uma queda da demanda por energia. É possível que UHRs sejam construídas como usinas híbridas, vinculadas a um sistema fotovoltaico ou turbinas eólicas, para armazenamento de seu excedente.
Contexto brasileiro
No Brasil existem 4 usinas consideradas reversíveis, mas operam majoritariamente como elevatórias, bombeando água para reservatórios superiores e transposições, sem grande aproveitamento dos outros serviços sistêmicos de flexibilidade. São elas: Traição e Pedreira, no rio Pinheiros (bacia do Tietê) e Santa Cecília e Vigário (complexo Light na Transposição do Paraíba do Sul para o rio Guandu).
Existem diversos estudos sobre o potencial brasileiro para construção de UHRs, alguns foram realizados nas décadas de 70 e 80 e requerem atualizações. Hoje, a EPE e muitos pesquisadores avaliam formas de aproveitar formações geológicas específicas ou antigas minas de carvão para reservatórios superiores e utilizar UHEs existentes como reservatórios inferiores. Na Europa, Canadá, EUA, China e Japão, as UHR são soluções já consolidadas. No Brasil, a grande participação de UHEs tradicionais e de regularização postergaram a necessidade de usinas reversíveis.